Saiba quais são as intervenções pedagógicas para alunos com dificuldade de leitura e escrita mais indicadas nos estudos científicos. Você terá acesso a várias sugestões para intervir de acordo com a neurociência.
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Seus alunos estão com dificuldade no aprendizado da leitura e da escrita? Essas habilidades já precisavam ter sido consolidadas, mas ainda não foram alcançadas?
Saiba que você não está sozinha (o), pois esse desafio é enfrentado por muitos professores.
O processo de aprender a ler e a escrever é muito complexo. Muitos fatores podem interferir nesse aprendizado. Por isso, o ensino dessas habilidades também não é algo simples.
Neste post, trago sugestões de intervenções pedagógicas para alunos com dificuldade de leitura e escrita. Mas, não são sugestões baseadas no “achismo”. Reuni alguns estudos científicos para fundamentar essa discussão.
Você vai saber quais são os sinais de alerta para as dificuldades de leitura e de escrita, quais são as principais causas, quais são as habilidades essenciais, o que a Ciência da Leitura recomenda, porque a consciência fonológica é importante e o mais legal: várias sugestões de intervenções pedagógicas para você implementar com seus alunos.
Espero que esse conteúdo possa te ajudar!
Como identificar os alunos que estão com dificuldades de leitura e de escrita?
Inicialmente, o primeiro passo é realizar um bom diagnóstico. Alguns instrumentos que podem ser utilizados:
- Sondagem de leitura
- Sondagem de escrita
- Observações em sala de aula
- Avaliações formais
- Atividades avaliativas lúdicas
- Avaliações externas
Susana Araújo (2021), no artigo “A Dislexia e a Alfabetização: Da Evidência Científica à Sala de Aula”, apresenta um quadro com alguns sinais de alerta que ajudam a identificar crianças em risco de dificuldades futuras na aquisição da leitura e da escrita.
Esses sinais de alerta são:
- Dificuldade no reconhecimento de palavras (por exemplo, diante um desenho com a legenda escrita “automóvel”, a criança lê “carro);
- Dificuldade em decodificar palavras (a criança lê silabando, acontece uma lentidão na conversão grafema-fonema, troca de letras como o b e d);
- Dificuldade em ler de forma fluída (omitir palavras, ritmo irregular de leitura, e velocidade de leitura com precisão abaixo do esperado pela idade);
- Dificuldades na escrita (erros de transcrição fonológica, troca de letras, trocas lexicais);
- Dificuldades na construção de frases e na organização das ideias de um texto;
- Evitar a leitura (distração fácil em momentos de leitura);
- Capacidades de leitura inferiores à capacidade cognitiva geral (tem um desempenho adequado nas demais áreas, mas demonstra dificuldades na leitura;
- Melhores resultados nas avaliações orais do que nas escritas.

Quais são as principais causas das dificuldades de leitura e escrita?
A psicóloga Inês Gomes (2021) no texto “Compreendendo o ato de ler: A Perspetiva do Modelo Simples de Leitura”, com base no modelo simples de leitura de Tunmer & Hoover, 2019, reflete que se o leitor aprendiz não está conseguindo extrair significado a partir do texto escrito, esse é um indício de que:
- Tem dificuldades com a compreensão da linguagem ou
- Tem dificuldades em reconhecer as palavras do texto, de forma precisa ou fluente ou
- Tem dificuldades tanto na compreensão da linguagem, quanto no reconhecimento de palavras.
Se em uma avaliação, foram identificadas dificuldades no reconhecimento de palavras, segundo Gomes (2021), o problema pode residir:
- Nas habilidades de codificação alfabética
- Instrução explícita insuficiente
- Oportunidades de prática inadequadas
Se mesmo após o reforço da instrução e de práticas explícitas, as habilidades de codificação alfabética não forem consolidadas, então as dificuldades podem advir de:
- Conceitos incipientes sobre a escrita
- Conhecimento inadequado do princípio alfabético (tanto a nível do conhecimento de letras, quanto ao nível de consciência fonêmica)
Já se a avaliação indicar dificuldades na compreensão da linguagem, segundo Gomes (2021), esse pode ser um indicador de:
- Conhecimento geral limitado: as crianças tendem a apresentar problemas em relacionar o significado de cada nova frase no discurso falado com os significados das frases que foram lidas anteriormente, a partir de inferências baseadas no conhecimento geral.
- Habilidades inferenciais subdesenvolvidas: se as dificuldades estão na compreensão de frases, isso pode significar um desenvolvimento insuficiente do conhecimento sintático (relativo à ordem das palavras na frase). Ou quanto ao conhecimento semântico (relativo ao significado das palavras e morfemas)
- Conhecimento linguístico deficitário: se as dificuldades estiverem relacionadas às confusões entre palavras semanticamente distintas, mas muito parecidas fonologicamente, – por exemplo cato-gato, deserto-decerto -, o problema está no conhecimento fonológico.
Quais são as habilidades essenciais para aprender a ler e escrever?
Diana Alves (2021), no texto “O Modelo RTI e a Alfabetização” discute o modelo de resposta à intervenção (RTI) no campo da alfabetização e a partir de estudos de diversos autores, indica os elementos essenciais à aprendizagem da leitura e da escrita no ensino fundamental:
- Conhecimento do alfabeto ou a capacidade de reconhecer produzir nomes e sons de letras e entender convenções do texto escrito
- Compreensão ou capacidade de recuperar informações
- Compreensão ou capacidade de realizar inferências
- Vocabulário
- Consciência fonológica
A ciência da Leitura (Science of Reading) tem muito a contribuir quando estamos com dúvidas sobre como intervir quando os alunos não avançam.
Trata-se de um conjunto robusto de pesquisas desenvolvidas ao longo de décadas por especialistas das áreas de educação, neurociência, linguística, psicologia cognitiva e fonoaudiologia.
Essa ciência busca responder, com base em evidências científicas, a uma pergunta essencial: como o cérebro aprende a ler e o que funciona, de fato, para ensinar a leitura?

O que a Ciência da Leitura recomenda?
A Ciência da Leitura recomenda cinco pilares para o ensino da leitura:
- Consciência fonêmica: Habilidade de perceber, identificar e brincar com os sons individuais em palavras faladas.
- Ensino estruturado da relação letra-som (fonética): as crianças precisam aprender explicitamente e em ordem lógica como as letras representam os sons da fala.
- Leitura fluente de palavras: com a prática, os alunos automatizam o reconhecimento de palavras. Isso libera espaço mental para a compreensão do texto.
- Desenvolvimento do vocabulário e linguagem oral: compreender textos depende de saber o significado das palavras e como elas se organizam.
- Compreensão de leitura: não basta decodificar. É preciso entender. Mas isso só acontece quando há domínio das etapas anteriores, além do conhecimento prévio e experiência com textos diversos.
Além disso, a Ciência da Leitura mostra que a maioria dos alunos com dificuldades de leitura pode avançar muito com intervenções precoces, sistemáticas e baseadas em evidências. Isso significa:
- Avaliar desde cedo a consciência fonológica e a decodificação.
- Oferecer ensino mais intensivo e explícito para os alunos que não estão avançando.
- Nunca depender apenas da “exposição ao texto”.
Por que é tão importante desenvolver a consciência fonológica?
De acordo com vários estudos, as práticas de ensino da leitura e da escrita que apresentam melhores resultados, são aquelas que ajudam os estudantes a compreenderem que as palavras são compostas por “pedacinhos de som” (sílabas) e que esses pedacinhos podem se dividir em “pedacinhos ainda mais pequenos” (os fonemas).
Sendo assim, o trabalho com a consciência fonológica no pré-escolar, 1º e 2º anos do Ciclo da Alfabetização ajuda na aquisição das habilidades de leitura e escrita, com sucesso.
Mas, também deve fazer parte do plano de intervenção para alunos com dificuldades na leitura e escrita, tendo um caráter remediativo, quando os alunos não conseguiram consolidar essa aprendizagem como era esperado.
Sugestões de intervenções pedagógicas para alunos com dificuldade de leitura e escrita
Agora, vamos ver algumas sugestões de práticas que podem ajudar os alunos no aprendizado da leitura e da escrita.
Conhecimento do alfabeto
Conhecer o nome das letras do alfabeto, bem como o formato de cada letra é muito importante.
Porém, saber apenas o nome da letra não é suficiente. Isso porque o aluno precisa compreender que quando lemos alguma palavra, não lemos o nome da letra, mas sim o som que ela representa.
Muito da dificuldade das crianças quando estão aprendendo a ler reside nesse detalhe. Por exemplo, dizemos B+A? L+A? Como dizemos o nome das letras, fica difícil compreender porque B+A=BA; L+A=LA, pois a junção dessas letras não deveria ser “Beaelea”?
Já quando a criança conhece o som do /b/ e do /l/ fica mais fácil “unir” esses sons com o som da vogal /a/ e formar a palavra.
Na maioria das vezes, os alunos já conhecem o nome das letras. Mas, quando ainda não conhecem, é possível trabalhar com o nome e o som das letras do alfabeto ao mesmo tempo.
Então, a preocupação inicial é essa: as crianças já aprenderam que cada letra representa um som?

Existe uma ordem para ensinar o som das letras do alfabeto?
Sim, existe uma ordem para facilitar a compreensão das crianças, seguindo etapas de complexidade.
A diferença entre as vogais e consoantes acontece devido a configuração do aparelho fonador durante a articulação desses sons. As consoantes são produzidas a partir de um obstáculo à saída do ar. Já nas vogais não há a presença desse obstáculo.
De uma maneira mais simples, quando você fala o som de uma vogal, o ar passa livremente pela boca. A boca se abre, a língua muda de posição, mas não há nenhum obstáculo no caminho do ar. Por isso, os sons são mais puros, abertos, mais sonoros.
Já quando você pronuncia o som de uma consoante, o ar encontra um obstáculo. Pode ser os lábios se fechando (como no /p/ ou /b/), a língua encostando nos dentes (como no /t/ ou /d/), o nariz ajudando na saída do som (como no m ou n).
Por esse motivo, identificar os sons das vogais é mais fácil.
O modo de articulação das consoantes também depende da forma como a obstrução do ar é feita. Sendo assim, há sons de consoantes que são mais fáceis de serem identificados pelos alunos.
Recomenda-se começar com os fonemas mais acessíveis e consistentes como /f/, /v/, /r/, /z/, /j/. Em seguida, ensinar os menos acessíveis como as consoantes oclusivas, por exemplo, /p/, /b/, /t/, /d/, /g/, /k/. E, finalmente ensinar os menos consistentes como o /s/
Primeiros passos para desenvolver a consciência fonológica

- Primeiramente, trabalhar a oralidade e percepção auditiva, para depois passar para a escrita.
- Trabalhar com rimas
- Realizar jogos de síntese fonêmica com sílabas. Por exemplo, dizer para a criança: vou falar uma palavra aos bocadinhos: ja/ca/ré. Que palavra acabei de dizer?
- Trabalhar a consciência de palavras
Por exemplo, contar quantas palavras há em uma frase dita ou lida.
- Contar o número de sílabas
Podemos usar folhas de atividades para pintar ou riscar o número de sílabas. Mas, no início, nem é necessário utilizar materiais impressos.
pode apenas dizer as palavras e pedir para a criança representar a quantidade de “pedacinhos” da palavra com massinha de modelar, pompom, algum grão, palitinhos, pecinhas de montar, enfim, são muitas as possibilidades.
- Identificar palavras que começam com a mesma sílaba
- Juntar uma sílaba a uma palavra e encontrar uma nova palavra. Por exemplo, se eu disser SA e em seguida COLA, fica uma nova palavra. Que palavra é?
- Omitir uma sílaba. Por exemplo, se eu tirar o MA da palavra MACACO, que palavra consigo formar?
Sugestões de intervenções para desenvolver a consciência fonêmica
A consciência fonêmica faz parte da consciência fonológica. Só que quando queremos seguir as etapas para fazer um ensino sistematizado, devemos considerar que é mais fácil para o leitor aprendiz compreender as unidades maiores. Assim, a consciência das sílabas e de rimas deve ser ensinada primeiro.
Em seguida, a consciência fonêmica precisa ser ensinada de forma explícita e sistemática, pois é uma habilidade difícil de ser alcançada espontaneamente.
Inicialmente, vemos que é importante apresentar o som das letras do alfabeto. Agora, eles precisam dominar um conhecimento mais complexo, que é a habilidade de “brincar” com esses sons para formar palavras.
Vamos às sugestões para desenvolver a consciência fonêmica?
- Isolar fonemas de uma palavra. Por exemplo, qual é o primeiro som de fada? Dizer a palavra prolongando o fonema inicial ffffffada.
- Identificar palavras que começam com o mesmo som
- Apresentar um conjunto de palavras para identificarem qual começa com um som diferente
- Pronunciar os fonemas de uma palavra, separadamente e ensinar as crianças a uní-los para formar uma sílaba ou palavra. Para facilitar, você pode utilizar letras móveis
- Bater uma palma para cada sílaba. Por exemplo, VE-LA. Para escrevermos vela, começamos a escrever o pedacinho que pronunciamos primeiro. Qual é esse pedacinho? Que sons tem o pedacinho VE? Qual pronunciamos primeiro?
- Subtrair fonemas: como fica a palavra OVO se juntar o som /p/?
- Substituir fonemas: se eu trocar o /s/ de SALA pelo /m/ qual nova palavra é formada?
- Reconhecer sílabas iguais. Pedir para a criança dizer cada palavra devagarinho. Assim que ela começar a pronunciar a primeira sílaba, levá-la a perceber o que acabou de dizer. Repetir esse processo com a outra palavra para ajudar o estudante a tomar consciência das sílabas.

Sugestões de intervenções para desenvolver a fluência
- Leituras repetidas de textos curtos
- Leituras repetidas de palavras
- Atividades em voz alta com o apoio da professora ou professor
- Treino da consciência fonológica
- Projetos de leitura, principalmente, motivar para o hábito de leitura
Sugestões de intervenções para desenvolver o vocabulário
- Conversas ricas
- Ser um exemplo de professor ou professora leitora. Ler diariamente para os alunos e apontar para as palavras à medida que as lê em voz alta
- Exploração de palavras novas
- Incentivo à oralidade
Sugestões de intervenções para desenvolver a compreensão de leitura
- Perguntas antes, durante e depois da leitura
- Atividades que envolvam inferências, sequências
- Ensinar estratégias de compreensão
- Utilizar resumos, mapas mentais, organizadores gráficos ou semânticos
- Detectar inconsistências em frases. Por exemplo, João não gosta de limão porque é uma fruta doce
Conclusão
Essas foram algumas sugestões de intervenções para alunos que apresentam dificuldades de leitura e escrita.
Vale ressaltar a importância de considerar as evidências científicas e de oferecer um ensino sistemático e explícito, já que as habilidades de leitura e de escrita não são adquiridas de forma natural.
Referências
ALVES, Diana. O modelo RTI e a Alfabetização. In: ALVES, Rui A; LEITE, Isabel. Alfabetização Baseada na Ciência. Brasília: Ministério da Educação, 2021, p. 122-147.
ARAÚJO, Susana. A Dislexia e a Alfabetização: Da evidência científica à sala de aula. In: ALVES, Rui A; LEITE, Isabel. Alfabetização Baseada na Ciência. Brasília: Ministério da Educação, 2021.
GOMES, Inês. Compreendendo o ato de ler: A perspectiva do Modelo Simples de Leitura. In: ALVES, Rui A; LEITE, Isabel. Alfabetização Baseada na Ciência. Brasília: Ministério da Educação, 2021, p. 257-287.
LEITE, Isabel. A importância da consciência fonêmica na aprendizagem da leitura e da escrita. In: ALVES, Rui A; LEITE, Isabel. Alfabetização Baseada na Ciência. Brasília: Ministério da Educação, 2021, p. 317-335.
SILVA, Ana Cristina. Consciência Fonológica e Conhecimento das letras. In: ALVES, Rui A; LEITE, Isabel. Alfabetização Baseada na Ciência. Brasília: Ministério da Educação, 2021, p. 220-244.