O senso numérico é uma competência fundamental para a fluência matemática. Descubra o que é senso numérico e como desenvolvê-lo com seus alunos.
Olá! Que bom ter você aqui!
O termo “senso numérico” não era tão conhecido.
Mas, atualmente, ele tem ganhado espaço em muitas discussões sobre o ensino da matemática. E é considerado uma competência básica para apoiar outros aprendizados matemáticos.
Neste post, você vai compreender o que é senso numérico, por que ele é importante para o desempenho em matemática, além de conferir várias sugestões e dicas para estimular e avaliar o senso numérico.
O que significa senso numérico?
Na comunidade científica não há consenso sobre o conceito de senso numérico. Na verdade, é um termo bem amplo.
Vou trazer neste post duas explicações que são bem esclarecedoras sobre o senso numérico.
A primeira é de Jo Boaler no texto “Fluência sem medo: pesquisas mostram as melhores formas de aprender fatos matemáticos”:
“Pessoas com senso numérico são aquelas que conseguem usar números com flexibilidade. Quando solicitadas a resolver a multiplicação 7×8, elas podem ter o número 56 gravado na memória, mas também conseguiriam calcular que 7×7 dá 49 e, então, acrescentariam 7 para resultar 56; ou somariam dez 7s e subtrairiam dois 7s (70-14). Não dependeriam, portanto, de uma memória distante” (Boaler, 2017, s/p)
A segunda definição é de Luciana V. Corso e Beatriz V. Dornelles, no artigo “Senso numérico e dificuldades de aprendizagem na matemática”
“O senso numérico é uma forma de interagir com os números, com seus vários usos e interpretações, possibilitando ao indivíduo lidar com as situações diárias que incluem quantificações e o desenvolvimento de estratégias eficientes (incluindo cálculo mental e estimativa) para lidar com problemas numéricos” (Corso; Dornelles, 2010, p. 300).
Sendo assim, senso numérico não é um conteúdo novo ou um modismo. É uma definição que nos lembra de ter uma nova postura no ensino. Ensinar os alunas a “pensar” e não somente aplicar fórmulas prontas.
Entender que precisamos trabalhar com a memorização e com algoritmos, mas antes disso, é preciso focar na compreensão sobre os números e o que eles significam.
Ao incentivar estimativas, múltiplas estratégias e conexões com a realidade, ajudamos os alunos a construir uma relação mais saudável e significativa com os números.
Qual é a importância de estimular o senso numérico dos alunos?
O senso numérico é uma competência fundamental para alcançar a fluência matemática.
Pesquisas indicam que ele é um importante preditor do desempenho em matemática nos anos iniciais.
Nesse sentido, uma característica observada em alunos com dificuldades de aprendizagem na matemática é um senso numérico pouco desenvolvido (Corso; Dornelles, 2010).
Por isso, é importante estimular o senso numérico tanto para prevenir dificuldades de aprendizagem, quanto para intervir em defasagens.
“(…) propor atividades que envolvam o trabalho com aspectos do senso numérico é não apenas ensinar matemática às crianças, como também consolidar conhecimentos de base que podem prevenir dificuldades de aprendizagem na matemática. Como fazer isso? A avaliação e a intervenção em senso numérico são importantes ações para a prevenção e para a mediação de dificuldades de aprendizagem na matemática nos primeiros anos de escolarização” (Assis et al. 2020, p. 7).
Além disso, ter a experiência de uma matemática mais aberta, flexível e desafiadora pode ajudar as crianças a desenvolverem emoções positivas com essa disciplina tão detestada.
Frequentemente, na sala de aula, nos deparamos com crianças que têm muita dificuldade em memorizar, usar os algoritmos e realizar o reagrupamento. A partir desse conhecimento podemos questionar: essas crianças desenvolveram o senso numérico? Quais habilidades preditoras que elas já deveriam ter desenvolvido estão dificultando essa aprendizagem hoje?
Quais habilidades estão relacionadas ao desenvolvimento do senso numérico?
O senso numérico não é algo único, mas uma combinação de habilidades que vão se construindo e aprimorando ao longo do tempo. Tais como:
- Reconhecer e comparar quantidades (mais, menos, igual).
- Compreender sequências numéricas.
- Identificar padrões em formas e números.
- Usar diferentes formas de representação (números, imagens, material concreto, símbolos).
- Compor e decompor números.
- Compreender a base dez.
- Saber realizar cálculos mentais básicos.
- Entender a relação entre operações básicas.
- Estimar a resposta antes de calcular.
- Avaliar a razoabilidade de resultados (perceber que, por exemplo, 3 × 25 não pode dar 3000).
- Selecionar estratégias de cálculo apropriadas para diferentes situações.
- Realizar números a conceitos cotidianos (hora, medidas, ordem etc.)
Como estimular o senso numérico em sala de aula?
O desenvolvimento do senso numérico não acontece apenas em atividades formais que aplicamos na sala de aula. Ele é fortalecido por meio de práticas cotidianas e reflexões matemáticas.
1. Privilegiar a compreensão e não a memorização
Essa, a meu ver, é a mudança mais significativa.
Quando há uma insistência na memorização antes da compreensão, não há espaço para desenvolver o senso numérico. Pois, quando aplicamos um conceito que já está pronto, não precisamos refletir, buscar estratégias, mas só decorar.
Você consegue explicar rapidamente o porquê do “vai um”, “pega emprestado”?
Por que na divisão começamos a “continha” pela esquerda, se na adição, subtração e multiplicação iniciamos pela direita?
Por que quando estamos operando com o segundo algarismo na multiplicação, deixamos um espaço vazio à direita?
Quantas maneiras diferentes você consegue pensar para resolver 16×8?
É difícil explicar, não é mesmo?
2. Explorar estimativas
Incentive as crianças a fazer aproximações antes do cálculo exato. Questione: quanto que você acha que vai dar o resultado dessa continha? É maior ou menor que (dizer o valor)?
No entanto, os alunos precisam entender que não se trata de “chutar” o valor, mas ter um raciocínio que justifique a estimativa.
3. Trabalhar representações variadas
Use materiais concretos, diagramas, retas numéricas e jogos.
Mostre que um mesmo número pode ser representado de várias formas.
4. Incentivar diferentes estratégias de cálculo
Em uma mesma atividade, proponha que as crianças resolvam utilizando duas ou mais estratégias. Por exemplo, cálculo mental, desenhos, diagramas ou algoritmo tradicional.
Valorize soluções criativas, mesmo que não sejam convencionais. Quando exigimos a utilização do algoritmo tradicional, estamos distanciando da matemática, os alunos que apresentam dificuldades de compreensão de estratégias convencionais.
5. Realizar conversas numéricas
Essa estratégia chamada “conversas numéricas” foi desenvolvida por Ruth Parker e Kathy Richardson. Segundo Jo Boaler, “é um dos melhores métodos para ensinar o senso numérico e os fatos matemáticos ao mesmo tempo”.
Você pode incorporar essa estratégia na rotina da sala de aula. Ela consiste em apresentar um problema abstrato de matemática e pedir para os estudantes resolverem mentalmente. Depois, o professor analisa como os alunos resolveram e anota as estratégias no quadro. Cada aluno ou grupo de alunos compartilha como chegou à resposta e todos conversam sobre as estratégias.
6. Propor problemas contextualizados
Traga situações da realidade dos alunos. Relacione números ao cotidiano para dar significado.
7. Usar jogos e desafios
Jogos de tabuleiro, cartas, adivinhações e enigmas matemáticos fortalecem o raciocínio numérico.
Pequenos desafios diários, como “qual é o número misterioso?”, estimulam a curiosidade.
8. Pedir para os alunos explicarem a resposta
Não valorize apenas a resposta final de atividades propostas na sala de aula. Incentive o aluno a explicar o passo a passo que percorreu para encontrar o resultado.
Como avaliar se os alunos estão desenvolvendo o senso numérico?
Avaliar senso numérico não significa aplicar apenas provas formais. É preciso observar atitudes, estratégias e justificativas. Algumas pistas:
- O aluno consegue comparar números e quantidades sem precisar calcular exatamente?
- Ele sabe explicar seu raciocínio e justificar o caminho escolhido?
- Consegue perceber quando um resultado “não faz sentido”?
- Usa estratégias flexíveis em vez de depender de um único algoritmo?
- Faz estimativas antes do cálculo exato?
- Demonstra segurança ao manipular números no cotidiano (compras, medidas, tempo)?
Algumas ferramentas são úteis para avaliação:
- Observação em atividades coletivas (rodas de conversa, jogos matemáticos).
- Registros escritos e desenhos que revelam o raciocínio.
- Diálogos em sala: pedir que o aluno explique “como pensou”.
- Situações-problema abertas, com mais de uma possibilidade de resolução.
Conclusão
Agora que você sabe a importância do senso numérico para a aprendizagem da matemática, reflita: você desenvolveu seu senso numérico?
Muitas vezes, temos uma visão negativa sobre a matemática porque não tivemos a oportunidade de enxergar toda a riqueza dessa disciplina. E de entender que não existe um único caminho para resolver os problemas matemáticos, mas que podemos ter nossas próprias estratégias, aquelas com as quais nos sentimos confortáveis.
Descobrir esses “novos conceitos” também é uma oportunidade de pensar que nós também podemos aprender e ressignificar nossa experiência com a matemática!
Referências
ASSIS, Évelin Fulginiti de; CORSO, Luciana Vellinho; THORNTON, Alessandra Figueiró; NUNES, Sula Cristina Teixeira. Estudo do senso numérico : aprendizagem matemática e pesquisa em perspectiva. Revista Eletrônica de Educação, v. 14, jan./dez. 2020, p. 1–15. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/211839. Acesso em 28 ago. 2025
BOALER, Jo. Fluência sem medo: pesquisas mostram as melhores formas de aprender fatos matemáticos. YouCubed, 2017. Disponível em: https://www.youcubed.org/pt-br/evidence/fluencia-sem-medo/. Acesso em: 28 ago. 2025.
CORSO, Luciana Vellinho; DORNELES, Beatriz Vargas. Senso numérico e dificuldades de aprendizagem na matemática. Rev. psicopedag., São Paulo , v. 27, n. 83, p. 298-309, 2010 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.phpscript=sci_arttext&pid=S010384862010000200015&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 25 ago. 2025.